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segunda-feira, maio 30, 2022

A OUTRA FACE DAS MÃES

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Fazia um tempão que não lia uma crônica diferente sobre mães. Aproveito o cabimento para tecer um breve comentário sobre o belíssimo texto [abaixo] da minha amiga escritora Arleni Portelada.
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Partindo do geral - Arleni dá close nas "mães de crianças exuberantes"- para o particular, quando nos leva até ao forno cheirando a bolo, feito por mãos passadas na casca do alho diante os revezes da vida.
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Pouco a pouco a angústia, misturada com raiva, salpicam nossa adormecida consciência nos fazendo acreditar que o segundo domingo de maio não é o Dia das Mães, mas o Dia de certas Mães!
A outra face das mães. Desfrute-a!
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A OUTRA FACE DAS MÃES
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Existem tipos de mães, que fogem a imagem emblemática da mídia incensada nos festejos. Não são citadas em propagandas e ninguém se dispõe a oferecer-lhes algum tipo de apoio moral ou emocional...nem uma flor.
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É mais charmoso, homenagear mães de crianças exuberantes como as dos comerciais de televisão. Jovens e belas; robustas e grisalhas senhoras fazem ótimas fotos, principalmente se emolduradas pelo status, que seus ditosos rebentos desfrutem na sociedade competitiva.
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A mãe que me inspira agora, era uma doméstica que trabalhava em minha casa. Tinha cinquenta anos, aparentava mais de sessenta; olhos opacos, pele pálida e um jeito de sorrir como se pedisse desculpa por existir. E foi muito sem graça, que ela me pediu um bolo, para comemorar com os filhos o dia das mães. Fez o bolo com exageradas medidas de carinho e o repartiu em dois embrulhos. Estranhei. Por que dividiu o bolo? Perguntei. Porque meus filhos não moram juntos: um está no IPPS e o outro no IPPO, respondeu.
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Um soco no meu estômago teria causado menos impacto, nunca me havia dado conta, que existem mães de presidiários. Lembrei-me das mães dos alcoólatras, dos drogados, dos loucos e até na mãe de Judas, sobre a qual nem a Bíblia falou nada, eu pensei. Lembrei-me dos pequenos famintos agarrados a saia da mãe pedindo mais que amor; lembrei-me das mães presidiárias quando lhes arrancam do seio os bebês nascidos na cadeia; lembrei-me das que furtaram no supermercado uma lata de leite, perderam a liberdade, a dignidade e os filhos. Pude imaginar seus corações literalmente dilacerados, ante a impotência humana de mudar o curso, do que os espíritas chamam de carma.
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Como gostaria de ter oferecido àquela mulher num abraço, toda minha solidariedade. Mas só fui capaz de balbuciar: Então faça dois bolos... e fui chorar no banheiro.
Arleni Portelada

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